domingo, 10 de junho de 2007

Bolañolatria

Se um bruxo, um dia, olhando uma bola de cristal, afirmasse que surgiria no continente latino americano um escritor capaz de se ombrear com Jorge Luis Borges, Júlio Cortázar, Gabriel Garcia Márquez, Juan Rulfo e Mario Vargas Llosa, seria peremptoriamente taxado de muy loco.

Mas esse escritor surgiu.

Roberto Bolaño, cuja obra passa a ser conhecida no Brasil somente agora, é o cara. Nascido em Santiago do Chile em 1953, Bolaño viveu muito tempo no México e depois partiu para a Europa. Mais exatamente para a Espanha, como um expatriado, fugindo do golpe militar que derrubou o governo democrático de Salvador Allende.

Na Espanha, impossibilitado de trabalhar legalmente, Bolaño exerceu diversas atividades. Foi lavador de pratos, vigia noturno, camelô. Apesar das adversidades, jamais abandonou a literatura. No México, fez parte de algumas vanguardas poéticas. Essa experiência será o mote do caudaloso romance Os detetives selvagens, um dos três livros dele agora disponíveis ao leitor brasileiro, em edição da Companhia das Letras. O leitor que se regalar com Os detetives selvagens poderá mergulhar nos outros dois: Noturno do Chile e A pista de gelo.

No livro A verdade das mentiras, Vargas Llosa analisa o romance moderno. Ele escreveu: “Em todas as obras-primas do gênero, esse fator quantitativo – ser abundante, múltiplo, duradouro – está sempre presente: em geral, o grande romance é, também, grande”. Claro que há exceções. Mas, no caso de Os detetives selvagens, podemos afirmar: na mosca! Suas mais de 600 páginas são puro deleite de inventividade, energia criativa, irreverência e humor corrosivo. A história dos poetas real-visceralistas Ulises Lima e Arturo Belano, uma espécie de alter-ego de Roberto Bolaño, é na verdade uma “carta de amor” a sua geração, conforme ele afirmou certa vez.

Uma das matrizes literárias de Bolaño é o romance policial, porém esse não é um recurso que ele utilize da forma costumeiramente conhecida. Para Bolaño, o que menos importa é solucionar o crime. O que interessa mesmo é narrar os dramas humanos e seus mistérios insondáveis, tudo sob o efeito magnetizador de uma linguagem poderosa.

Roberto Bolaño morreu em 2003, aos 50 anos, de insuficiência hepática, mas antes teve a sorte de ver sua literatura reconhecida através dos vários prêmios que ganhou, e do reconhecimento (e algumas vezes do refugo) da crítica. Um ótimo histórico da vida e da obra de Bolaño pode ser lido aqui (em espanhol). E aqui uma entrevista (dividida em 6 partes) que ele concedeu à TV chilena.

Um escritor da estatura de Bolaño não deixou de atrair detratores. A revista Entrelivros que está nas bancas traz uma ótima análise do escritor espanhol Javier Cercas, a qual rebate boa parte da crítica (infundada) sobre a obra do chileno.

3 comentários:

margarida disse...

Fico curiosa... Despertaste-me o interesse.

Romildo Guerrante disse...

Belo blog, limpo, claro, com excelente qualidade de fotos, trabalho de formiguinha do Incansável Paulo. Meus parabéns!

Anônimo disse...

Concordo integralmente.
E o termo Bolañolatria é ótimo.